terça-feira, 23 de junho de 2009

DESABAFO DE UMA JORNALISTA DIPLOMADA

Quando escolhi fazer jornalismo, estava numa aula de história, no antigo 3º colegial, gozando de um passeio à Ilha de Búzios, que integra o arquipélago de Ilhabela, prêmio conquistado por uma redação que escrevi. No entanto, desde que entrei no colégio, já na antiga 2ª série, meus professores falavam do meu dom de escrever, de me expressar, de colocar meus pontos de vista, sugeriam que eu fizesse jornalismo.


Leninha Viana é jornalista profissional e diretora de base do
Sindicatodos Jornalistas de São Paulo, Regional Vale do Paraíba, Litoral Mantiqueira


Eu fiz. Não somente porque me sugeriram, mas também por saber dentro de mim que essa era a minha vocação aqui na Terra. Poderia exercer esse dom de várias maneiras, dar minha colaboração como articulista nos jornais locais, opinar sobre esse ou aquele assunto, dar “pitaco” naquela ou nessa situação, exercer a LIBERDADE DE EXPRESSÃO a que todos têm direito assegurado pela Constituição. No entanto, para ser JORNALISTA, eu precisava de uma formação, não bastava apenas sentar na cadeira e expor meus pensamentos num papel, até porque, na faculdade, eu aprendi que o exercício jornalístico é muito mais do que uma atividade literária, é necessário escrever com técnicas. Aprendi que o jornalista deve ser imparcial, contar os fatos, ouvir os dois lados, para que os leitores, ouvintes, telespectadores, tenham acesso à informação de qualidade e formem sua própria opinião diante do fato exposto.

Sim, prestei vestibular, passei na primeira chamada, mesmo contrariando muitas expectativas por ter cursado escolas públicas. Saí de Ilhabela aos 18 anos e fui enfrentar uma “cidade grande” sozinha, fui absorver todo o conhecimento que era capaz e crescer diante da vida. Não poderia ter feito isso sem a ajuda dos meus pais. Com muitas dificuldades eles custearam meus estudos, eu trabalhei durante os quatro anos pra pagar minha estadia. Recorri à bolsa de estudos da Prefeitura para conseguir permanecer nessa jornada, contei com a ajuda de amigos especiais que por diversas ocasiões me ajudaram financeiramente e até mesmo com alimentação quando a grana estava muito curta.

Por quatro anos me instruí para ser uma profissional de qualidade. Minha vocação? Ajudou e muito, principalmente a paixão que tenho pela minha área, pois aliada ao conhecimento que adquiri no curso de Jornalismo, são responsáveis por eu estar atuando na área desde que me formei, pois me tornei uma profissional competente e dedicada.

Assim como eu, existem milhares de outras pessoas com histórias até mais interessantes e difíceis do que a minha, pessoas que cursaram universidades públicas, mas que tiveram custos com livros, roupa, calçado, alimentação e hospedagem, pessoas que viajam diariamente por essas estradas da vida em busca de formação profissional, pessoas que não cursaram universidade porque nasceram bem antes de 1969, quando o curso de Jornalismo foi regulamentado, mas que hoje defendem a formação para o exercício da profissão.

Existem pessoas que tanto quanto eu acreditam que o Jornalismo é uma carreira tão importante como a de um médico, advogado, professor, como qualquer outra, que para ser exercida é necessária uma formação técnica.

Mas tudo isso não teve valor para os senhores ministros do Supremo Tribunal Federal, que com toda empáfia e poder que lhes foram atribuídos suspenderam a exigência do nosso Diploma para o exercício da nossa profissão. Ignoraram 40 anos de história, de lutas, de investimentos, de estudo, de informação de qualidade em função de uma minoria que insiste em atuar no mercado sem ter a qualificação necessária para fazê-lo.

A ridícula decisão do STF só beneficia o grupo patronal, os donos de empresa, que querem mão-de-obra barata. A quem devo recorrer para ressarcir todo o investimento em minha formação já que meu Diploma não vale mais nada?

Toda a formação a que esses ministros se dedicaram para chegar onde estão também foi ignorada com essa decisão esdrúxula, pois se na visão deles, o jornalismo é uma atividade autodidata, todas as profissões também o são, ora, pois na verdade o ser humano é autodidata. Dessa forma, se meu diploma não vale mais nada, vou me dedicar a estudar livros e mais livros de advocacia e exercer o direito por aí. Ou quem sabe medicina? Ou ainda odontologia? Qualquer outra carreira do tipo. Basta acordar com vontade de exercer uma nova profissão e me dedicar a tal.

É assim que deveriam funcionar as coisas a partir de agora. O curso de jornalista não impede que profissionais incompetentes façam coisas que desabonem nossa atuação? No direito, na medicina, na educação, em todas as áreas também existem maus profissionais. A formação profissional é condição mínima para exercer qualquer função especializada e o bom desempenho dependerá do caráter e da personalidade de cada um.

Alguém já perguntou para a sociedade se eles preferem ter acesso a informação através de um profissional qualificado ou de um precário? A situação é inconcebível e a própria sociedade não deveria fechar os olhos para isso. Está mais do que na hora de levantar o “traseiro” da cadeira e exigir informação de qualidade, vinda de profissionais competentes e qualificados para tal.

E aos demais profissionais de outras áreas, atenção, pois o golpe contra os jornalistas profissionais diplomados pode ser apenas o primeiro passo para atingir as demais carreiras. Um profissional precário é muito mais barato e manipulável do que um qualificado e com formação.

Não pensem os senhores ministros que me dou por vencida. Eu e todos os meus colegas diplomados desse país. Apesar de tudo, sabemos que o conhecimento que adquirimos na universidade ninguém tira e isto aliado à nossa vocação e experiência de vida faz e continuará fazendo a diferença entre um bom jornalista e um jornalista precário. Eu creio!

Leninha Viana
Jornalista MTB 43.079/SP